Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol, é uma história na qual a imaginação é a sua protagonista. Na sua maioria, a obra decorre num país fantástico, onde tudo não passa de pura imaginação. O mundo onde entra Alice é caracterizado pelo seu grau de estranheza e anormalidade. O autor dá vida aos personagens, isto é, aos animais, e confere um carácter relativo ao que chamamos de “tempo” e “tamanho físico”.
Alice é uma menina diferente, gosta de acção e aventura, o que lhe suscita bastante interesse, e o que talvez seja uma boa justificação para o facto de ser um pouco curiosa.
Na verdade, toda a aventura não passa de um sonho, o que faz com que as regras presentes na realidade sejam quebradas, dentro de um mundo tão desorganizado e sem leis ou princípios, como é o mundo do País das Maravilhas.
Presentes na obra, encontramos algumas perguntas como, “Quem sou eu?”, “Como sou eu?” ou “O que sou eu?”. Alice interroga-se acerca da sua identidade e, ao longo da história, observa-se um autêntico desequilíbrio entre aquilo que Alice é e aquilo que pensa que é, havendo assim uma certa distância entre ela e o seu sujeito, uma certa separação entre “eu” e “a minha pessoa”. No final do livro, iremos ver e concluir que são precisas todas as peripécias que vão ocorrendo ao longo da narrativa para Alice se encontrar e perceber quem realmente é, e como é.
Outro facto que nos chama à atenção é a questão da justiça. Será que a justiça é praticada “correctamente”, ou melhor, como a praticamos na nossa sociedade? Será dentro deste mundo imaginário onde Alice tudo questiona e estranha, que a justiça actua pela igualdade de todos e pelo bem conjunto?
A justiça, nesta obra, é algo bastante superficial, que quase ou nada tem a ver com o próprio conceito de “justiça” dentro da nossa sociedade. A justiça é exercida inconscientemente, onde o juiz pode então desempenhar o cargo de jurado ou outro. A justiça é algo supérflua neste mundo fantástico. No País das Maravilhas, a justiça é exercida consoante a necessidade ou agrado do que a exerce.
Como já referido, a justiça dentro desta obra, a meu ver, é algo superficial, algo que se faz passar despercebido. É apontada como algo de uma extrema ignorância e imparcialidade, pois alguém que seja superior pode tomar as posições que lhe agradarem, posições essas que poderão ser inconscientes e, ou imparciais, sem qualquer reflexão.
A própria da justiça é injusta, prevalecendo assim a lei dos mais fortes, que por sua vez, têm um grande peso dentro da história.
Na obra, as palavras nem sempre são usadas de acordo com o seu significado, podendo assim serem usadas por Alice pelo simples facto de serem “pomposas”.
No capítulo primeiro, Alice questiona-se: “Será que gatos comem morcegos?”, “Será que morcegos comem gatos?” Aqui, deparamo-nos com uma certa inversão dos factos perante o desconhecido.
Em várias passagens, Alice sente como que alguma falta de coerência em atitudes dos personagens, não concordando assim com algumas delas. Muitas vezes, o ser humano age como louco, daí a afirmação do Gato de Cheshire, de que “somos todos loucos” e de que se Alice não o fosse, não teria entrado naquele mundo. A loucura, nesta história, é bastante relativa, pois depende de padrões de comportamentos estabelecidos como “correctos” numa sociedade, tendo como eixo de sustentação um certo modelo. O Gato aborda assim essa tal relatividade.
Ao longo da acção, que nem sempre é concisa, repleta de entrar e sair de personagens, acontecimentos variados, e a dúvida do que é afinal a moral, Alice sofre diversas mudanças, isto é, Alice passa por uma série de metamorfoses, como a mudança de tamanho. Este facto é contínuo e presente na história, pois Alice ora aumenta, ora diminui. Na minha opinião, essa oscilação de tamanho talvez tenha que ver com o nível de confiança a que Alice se encontra nesse determinado momento.
Assim, Alice é uma jovem que se encontra no estado de transição entre a infância e adolescência, uma rapariga de personalidade sonhadora, que vive num mundo próprio com uma ténue ligação à realidade, contrariamente ao que acontece com a irmã. A obra passa então não só a ideia do que é o mundo fantástico, e das suas repercussões e distinções com a realidade, mas também o que Alice tem de passar e os obstáculos que se levantam perante ela que mais tarde a ajudam a descobrir quem verdadeiramente é e o seu crescimento e mudança de criança para adolescente.
Alice no País das Maravilhas é apresentado como um conto infantil, mas é preciso não se ser tão inocente e perceber que para além da história de uma menina que sonha com um país imaginário e oposto ao mundo da realidade, uma história como esta pode tão bem mostrar as mudanças que ocorrem quando passamos de crianças para adolescentes e as fases pelas quais temos de passar para descobrirmos quem realmente somos.
Inês Ameixa nº14
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