Paúis
Paúis de roçarem ânsias pela minh' alma em ouro...
Dobre longínquo de Outros Sinos... Empalidece o louro
Trigo na cinza do poente... Corre um frio carnal por minh'
alma...
Tão sempre a mesma, a Hora!... Balouçar de cimos de palma!
Silêncio que as folhas fitam em nós... Outono delgado
Oh que mudo grito de ânsia põe garras na Hora!
Que pasmo de mim anseia por outra coisa que o que chora!
Estendo as mãos para além, mas ao estendê-las já vejo
Que não é aquilo que quero aquilo que desejo...
Címbalos de Imperfeição... Ó tão antiguidade
A Hora expulsa de si-Tempo! Onda de recuo que invade
O meu abandonar-se a mim próprio até desfalecer,
E recordar tanto o Eu presente que me sinto esquecer!...
Fluido de auréola, transparente de Foi, oco de ter-se.
O Mistério sabe-me a eu ser outro... Luar sobre o não
conter-se...
A sentinela é hirta - a lança que finca no chão
É mais alta do que ela... Para que é tudo isto.... Dia
chão...
Trepadeiras de despropósitos lambendo de Hora os Aléns...
Horizontes fechando os olhos ao espaço em que são elos de
ferro...
Fanfarras de ópios de silêncios futuros... Longes trens...
Portões vistos longe... através de árvores... tão de ferro!
Análise Pessoal:
A "Hora" a que o sujeito poético se refere é como
que uma personificação do tempo presente, do que aflige o poeta, como se fosse
a sua própria prisão.
O poeta sente-se encarcerado no presente, que acabar por se
tornar um prisioneiro de si mesmo. "Tão sempre a mesma hora" é equivalente
a: sempre esta a minha angústia!
Quando o poeta afirma que "a Hora expulsa de si
tempo", podemos interpretar que o tempo vai passando; mas acrescenta logo
que isso é apenas como uma "onda de recuo que invade o seu abandonar-se a
si próprio até desfalecer". Ou seja, o tempo pode passar mas a situação
angustiosa do poeta (a sua “Hora”) permanece presente. Daí, "um mudo grito
de ânsia põe garras na Hora", que demonstra a angústia pela permanência da
sua Hora.
Os vários tempos (o passado, o futuro e o presente) estão
bem marcados no poema. Referem-se ao passado: "dobre longínquo de outros
Sinos", "Ó tão antiguidade", "onda de recuo que invade o
meu abandonar-me a mim próprio até desfalecer". Sendo que esta última
expressão pode acabar por nos remeter para a ideia que as memórias dos tempos
passados também servem para alimentar a angústia do presente.
Referem-se ao futuro: "Estendo as mãos para além",
"Trepadeiras de despropósito lambendo de Hora os Aléns",
"...silêncios futuros...", "Longes trens...", "Portões
vistos de longe... tão de ferro!" Com estas expressões sobre o futuro
podemos compreender que o futuro também não traz uma noção de ‘descanso’ ao
poeta, pois sente que o futuro está longe e barrado por portões de ferro.
Podemos então entender que o poeta é não só um prisioneiro do espaço (pelos
portões de ferro) mas também do tempo (pela impossibilidade do futuro).
O fulcro da angústia situa-se no presente, na Hora. Isto
porque por mais que o poeta tente pensar no passado ou no futuro para se
confortar ou ambicionar algo melhor, este continua carregado de desilusões.
Este pode ser um indicador do porquê da letra maiúscula da Hora, esta é o
presente que sintetiza o passado e o futuro.
Podemos então interpretar como uma das razões da angústia do
poeta a sua fragmentação do Eu. Ou seja este sente-se dividido entre vários
tempos e até entre vários espaços, nunca conseguindo encontrar a unificação.
É ainda importante realçar o facto de que tudo o que está
contido neste poema não é uma espécie de lamentação do sujeito poético, mas
antes apenas uma descrição do seu estado fragmentado.
Andreia Rosa, nº2 12ºE
Andreia Rosa, nº2 12ºE
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